Fazenda de Gute Fernandez — com Rosa Villas-Boas, Angela Nou e Dalmiro Coronel. Foto acervo Dalmiro Coronel |
Anos 70 Bahia – Episódio
22
A fazenda de Gute
Fernandez, em Feira de Santana, era um desses pontos de encontro: casarão
antigo, quartos amplos, piano na sala. O artista plástico Cândido Soler
apareceu lá para passar um fim de semana e ficou quase três meses. Era assim na
fazenda Cipó e também na fazenda Guará, de Jonga Falcão, em Barreiras: uma
comunidade de três casas com cozinha geral, por onde passou muita gente. Um
paraíso nessa bela parte do oeste baiano antes da soja, com rios cristalinos e
sem os venenos dos agrotóxicos.
Equilíbrio é arte em vida, e arte nos ensina. Aqui Rosa-Villas boas dá um show na borda de um veleiro, perto de Morro de São Paulo. Foto Dalmiro Coronel |
O cineasta Domingos de
Oliveira relata, em sua autobiografia, que a importância do movimento hippie
não foi levada em conta pela esquerda: “Penso que foi o movimento mais
importante que houve no mundo, depois da revolução comunista em 1917. Porém, a
consciência revolucionária, esta foi destruída pela sociedade de consumo com um
vendaval maligno, um sopro infernal. (...) Concordo com quem acha que o maior
erro da esquerda foi não ter percebido de imediato que os hippies não eram seu
oposto, mas sim, sua continuação! Isso foi um erro político lastimável,
trágico!”
Era um tempo de
descobertas, enfrentamentos e opções antagônicas entre o engajamento e o
desbunde, entre o deixa rolar e o deixa sangrar. No Brasil, a cortina desceu
abruptamente em meados dos anos 60 e acirrou-se no final da década, marcando os
70 com a contradição entre o hippismo marginal ao sistema num extremo, e a luta
armada contra o regime militar no outro. Neste episódio, o livro Anos 70 faz
uma visita-relâmpago à contracultura (tema abordado nos episódios 3, 4, 17 e 18
aqui postados), mais adiante o faremos ao engajamento político.
O fato é que, no âmago
da contradição, havia afinidades e convergências. Para a professora Heloísa
Buarque de Holanda, “a gente tinha a certeza que ia fazer a revolução; era uma
geração voluntarista, sem dúvida, e estava tudo indo muito bem. Quando 68
chegou, foi o último berro. (...) Tudo era proibido, mas já havia começado uma
certa fragilização desse controle quando veio o segundo golpe, que abortou um
projeto que estava num pique absurdo. Porque o tropicalismo e a passeata se
confundiam. Era a mesma coreografia. (...) Foi uma hora em que a cultura fez
política". (Tirado do livro “Enquanto corria a barca”, de Lucy Dias – pgs.
34 e 35).
Bakunin, Thoureau,
Huxley e guerra fria a parte, o movimento hippie aplicou um choque cultural de
alta voltagem no “establishment” das décadas de 60 e 70, sacudindo os pilares
da velha ordem: aproximou-nos da natureza e dos ideais igualitaristas, fez um
link do ocidente com o oriente, em especial no misticismo e na música,
legou-nos a comida macrobiótica e a liberdade feminina, juntando as mulheres e
os homens na mesma pegada; celebrou a simplicidade em oposição ao capitalismo consumista,
falou de paz, amor, aventura, viagens, buscou novas percepções do nosso mundo e
do universo, garimpou shangrilás em regiões paradisíacas do planeta.
Marquinhos Rebu e amigas na ilha de Itaparica |
O poeta Galvão, dos
Novos Baianos, resumiu: “Desenvolveram-se aptidões manuais e criou-se um mercado
artesanal de trabalho. Aboliu-se de cara o livro de ponto, o horário, a
materialização do patrão e por aí o jovem escolheu sua vida. Sinto dizer que
alguns piraram, e outros, os pais (por ignorância) colocaram no sanatório”. É
certo que houve céu e inferno, luz e trevas, como em qualquer revolução, mas o
legado que deixou não foi aproveitado como devia. Será?
Cacá Dourado e Sérgio Souto (saudades!). Do baú de Oscar Dourado |
FERNANDO NOY (comentando a foto acima) – Sérgio Souto, que maravilha revê-lo, aquele abraço. E nada menos Oscar (Cacá) Dourado,
um dos grandes amigos-irmãos da Bahia, com aquele esplendor que segue
sempre irradiando, pois o visitei há pouco e a Inês e suas filhas.
Venerados. Que maravilha esta foto. Ovações!!!
FERNANDA FALCÃO TORRES –
Oiiii!! Sou filha de Petúnia Maciel e Marcos Maciel Santos. Acompanhei muito
desses momentos com o olhar de criança e pré-adolescente! Foram definitivamente
anos do "muito": muita alegria, farra, música, amigos, drogas,
descobertas, loucos... e por aí vai.... Vivi no sítio dos Novos Baianos,
moramos na casa de Caetano e Dedé, festas maravilhosas na casa de Gil e Sandra
Gadelha, moramos muito tempo na Boca do Rio, que, durante algum tempo, me
parecia uma mini-aldeia hippie... kkkkkkkkk... Com Joildo Goes sendo Joildo,
Keka Almeida lindíssima... Na casa de Veras tinha uma baleiro enorme, cheio de
tudo o que uma criança mais gostava, eu nunca tinha visto igual... Fiquei
louca!! E ele, vendo minha cara de "vontade daquilo tudo", me deu
todos os doces do baleiro!! Foi um dos dias mais felizes da minha infância...
Fiz curso de jazz com Lennie Dale e tive a sorte de no meu aniversário ter uma
dança coreografada por Paulete dos Dzi Croquetes, era baseada na novela Dancing
Days... Íamos a Itaparica para visitar João Ubaldo, ele e Petúnia enfiavam o pé
na jaca. Fazenda em Ipiaú... Zebrinha! Xoxa foi meu fiel escudeiro durante a
adolescência, uma companhia inestimável... meu Deus... tem muito mais... tantas
lembranças! Não... Não foi fácil ser criança e filha de pessoas que viveram
intensamente esses anos, mas sou privilegiada de ter esses pais. Sou filha
desses anos felizes... Axé!!
Era Lacerda Encarnação, clicada por Candinho |
FERNANDO NOY (comentando a foto acima) – Era!!! Fabulosa presença dos anos 70. Até hoje sempre tão amada, admirada, recordada... besos!!
ERA LACERDA ENCARNAÇÃO – Meu amado e generoso amigo, te amo!!! Beijos mil!
JOSE JESUS BARRETO – O
amor, o sorriso e a flor / sexo, drogas e rock n'roll – mais revolucionário
para a humanidade que revoluções armadas que tantas vidas ceifaram. Precisamos
de novas revoluções no campo da cultura, das artes, do comportamento, do pensamento.
O séc XXI, parece, ainda nem começou.
EURICO DE JESUS – Passou
como uma agradável e lúdica brisa utópica, refrescando nossos corpos e mentes:
"Quem não dormiu no sleep bag / nem sequer sonhou"!
TACILLA SIQUEIRA – O
facebook tornou-se enfim mais psicodélico, artístico e afetivo. Lindo o resgate
dos anos 70! Eu me lembro de muitas dessas viagens loucas e dos encontros
festivos no nosso apartamento no Canela, onde eu trafegava de camisolinha por
entre cabeludos dançantes. Nas minhas memórias infantis a vida era uma grande e
linda festa, onde se bailava, ria e filosofava... E bastava aqueles encontros
onde todos eram simplesmente felizes... E igualmente felizes éramos nós as
crianças criadas nos anos 70.
Elsior Lapo
Coutinho –
Adorei o depoimento da filha de Marcos Maciel, ícone de nossa época. Ela resume
e fala de tudo que vivemos, muito bom.
Marcos José
Souza – Que
maravilha! Enquanto vocês viviam esse sonho, daqui, quando criança, acompanhava
alguns flashes pelas ondas sonoras das saudosas rádios Excelsior e Clube.
Tempos árduos. Tempos dos setenta. Um grande beijo ao Anos Setenta Bahia.
Obrigado pela partilha.
Fernando Noy: "Não eram nada confortáveis quando levavam as pessoas seminuas e felizes em ácido, cheias de alegria... mas aconteceu... fusca do diabo!!!" |
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